Anacoluto

Por Diogo Berquó

O anacoluto é uma figura de linguagem cuja base é a interrupção da estrutura oracional, de modo que ocasiona o isolamento de determinadas palavras e expressões, fazendo-as perder a função sintática. Ressalta-se o fato de esse recurso estilístico ser, principalmente, observado em contextos de comunicação oral. Levando em consideração que o anacoluto diz respeito à organização dos termos, faz-se necessário distingui-lo do hipérbato, o qual constitui apenas uma reordenação das palavras e expressões.

Leia também: Assíndeto – figura de linguagem que consiste em omitir conjunções coordenativas

O que é anacoluto?

Anacoluto é uma figura de linguagem relacionada à sintaxe, ou seja, que diz respeito à organização das palavras nas orações. Esse recurso estilístico é pautado no rompimento do sistema lógico-gramatical, o que desencadeia a perda da função sintática de algum elemento pertencente à oração, isto é, o termo ou locução que inicia a oração é seguido por uma estrutura estranha a ele, levando-o a ficar isolado e, portanto, a não exercer um papel no contexto.

O anacoluto, assim como o personagem presente na imagem, fica isolado na oração.
O anacoluto, assim como o personagem presente na imagem, fica isolado na oração.

Uso do anacoluto

O anacoluto ocorre de forma bastante frequente na oralidade, tendo em vista que os falantes, ao se comunicarem, são propensos a elaborar topicalizações (destacam o que será o tema do diálogo), mas utilizam outras estruturas sintáticas para desenvolver o assunto. Isso ocorre devido, principalmente, à dificuldade que a linguagem encontra em traduzir a velocidade do pensamento, assim, o indivíduo, no momento da externalização das suas ideias, não antevê que o início de sua manifestação impossibilita a conclusão de seu raciocínio, tornando imperativa, a partir do momento da consciência, a mudança de organização dos termos.

Exemplo

Esse seu jeito, sua forma de falar me incomoda!

Esse seu jeito,

sua forma de falar

me

incomoda!

Sem função sintática

sujeito

objeto direto

verbo transitivo direto

Perceba que “Esse seu jeito” ficou desconectado da frase e, inclusive, foi separado por vírgula, já que essa pontuação costuma marcar o anacoluto.

Além da oralidade, o anacoluto é encontrado em textos literários, entretanto a sua utilização em composições escritas que exijam a atenção à norma-padrão não é recomendada, pois é um recurso estilístico que origina falhas na coesão textual.

Exemplos dessa figura de linguagem em obras literárias:

  • E o desgraçado, tremiam-lhe as pernas, sufocando-lhe a tosse. (Almeida Garrett)
  • O homem, chamar-lhe mito/ não passa de anacoluto. (Drummond)
  • Olha: eu, até de longe, com os olhos fechados, o senhor não me engana. (Guimarães Rosa)

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Anacoluto e hipérbato

Apesar de o anacoluto e o hipérbato serem construídos a partir do desvirtuamento da organização padrão das palavras na oração, eles possuem diferenças. O primeiro, conforme visto, diz respeito a uma interrupção do eixo sintagmático, levando uma palavra ou expressão a ficar sem classificação sintática, enquanto o segundo mantém a categorização de todos os elementos, mas há uma mudança da disposição típica deles. Assim, se a nossa língua se configura num sistema SVO (sujeito + verbo + objeto), quando o hipérbato acontece, a oração pode assumir a ordem OSV (objeto + verbo + sujeito), desde que a transformação conte com um objetivo expressivo.

Exemplos de hipérbato:

  • Eu comi uma pizza. (sujeito + verbo + objeto)
  • Uma pizza, eu comi. (objeto + sujeito + verbo)

“Essas que ao vento vêm

Belas chuvas de junho!” (J. Cardoso)

Para saber mais sobre essa figura de linguagem caracterizada pela inversão sintática, leia o texto: hipérbato.

O anacoluto é uma figura de linguagem responsável por gerar uma ruptura na estrutura frasal.
O anacoluto é uma figura de linguagem responsável por gerar uma ruptura na estrutura frasal.

Exercícios resolvidos

Questão 1 Identifique a alternativa que contém um hipérbato.

A) “Sobre o banco de pedra que ali tens/ Nasceu uma canção.” (Vinícius de Moraes)

B) “Ando devagar porque já tive pressa/ Levo este sorriso porque já chorei demais.” (Almir Satter/Renato Teixeira)

C) “Jamais permitiria que seu marido fosse para o trabalho com a roupa mal, não dissessem os colegas que era esposa descuidada.” (Marina Colasanti)

D) “Ser ou não ser, eis a questão.” (William Shakespeare)

Resolução

Alternativa A, pois houve uma inversão da ordem sintática. Observe: Nasce uma canção sobre o banco de pedra que ali tens.

Questão 2 – Indique a frase em que há um anacoluto.

A) Não estou ciente se eles virão, aqueles mentirosos.

B) A primogênita, que tanto gostava da mãe, impactou-lhe muito a falta de união.

C) O presidente americano, diante desta acusação, corre o risco de não ser reeleito.

D) Senhores, que se intitulam donos da verdade, por acaso, já se policiaram para não falar besteira.

E) Quando visito um museu, reflito sobre como a história nos parece distante, mas faz parte do presente. 

Resolução

Alternativa B, pois houve uma interrupção sintática, deixando “a primogênita” sem função na oração.

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