Crônica narrativa

Por Rafael Camargo de Oliveira

A crônica narrativa é um gênero textual pertencente ao campo do jornalismo que apresenta linguagem próxima da oralidade e trata do cotidiano.

Crônica é um texto muito presente na mídia, impressa ou digital, e de grande interesse do público devido à sua fácil leitura.
Crônica é um texto muito presente na mídia, impressa ou digital, e de grande interesse do público devido à sua fácil leitura.

A crônica narrativa é um gênero predominantemente narrativo que trata do cotidiano. Ela apresenta poucos personagens, possui tempo e espaço bem definidos e pode ter tom de humor. Além disso, a crônica narrativa é caracterizada por uma linguagem simples. Por vezes, é utilizada a forma coloquial da língua para gerar aproximação com o leitor.

Esse tipo de crônica é considerado um texto ficcional que narra acontecimentos da realidade cotidiana das pessoas. Assim, uma crônica narrativa trata, de certa forma, o campo ficcional como possibilidade real.

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Resumo sobre crônica narrativa

  • A crônica narrativa é um texto em que predomina a tipologia narrativa. Ela consiste em um texto de leitura rápida e fácil, com personagens, tempo e espaço que se aproximam do cotidiano e da realidade do leitor.

  • Ela possui elementos essenciais da narração, tais como as personagens, o tempo e o espaço. Sua estrutura pode ser sintetizada em apresentação, enredo e desfecho (encerramento).

  • Para desenvolver uma boa crônica narrativa, é importante estudar o gênero, observar hábitos cotidianos, selecionar a história ideal, montar a estrutura do texto e, se possível, criar um efeito de surpresa.

  • A crônica narrativa é um dos tipos de crônica existentes. Há também a crônica argumentativa e a crônica filosófica, em que predominam as tipologias argumentação e exposição, respectivamente.

Videoaula sobre crônica narrativa

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Característica e estrutura da crônica narrativa

Por se tratar de um texto em que predomina a tipologia narrativa, a crônica narrativa contém em sua composição estrutural alguns elementos essenciais da narração, tais como personagens, tempo e espaço. Porém, por ser um texto breve, a crônica narrativa não se aprofunda nesses elementos, visto que eles são identificáveis pelo leitor por meio de seu próprio cotidiano.

Nesses termos, prevalece na crônica a simplicidade na composição básica dos componentes da narração (personagem, tempo e espaço). A configuração da crônica narrativa, em seu aspecto estrutural, pode ser subdividida da seguinte forma:

  • Apresentação: etapa em que o leitor é introduzido à narrativa. Inclui os elementos iniciais da história, personagens envolvidas e identificação de espaço e tempo.

  • Enredo: é o passo seguinte à apresentação. Diferentemente de outros textos narrativos, a crônica narrativa geralmente não possui um conflito. Narra-se um acontecimento cotidiano que pode ou não envolver tensões — a escolha fica a critério do autor. A história também pode contar com um narrador ou ser formada apenas por diálogos entre as personagens (discurso direto).

  • Desfecho: trata-se do encerramento da história. Apesar do nome, o desfecho da crônica não é necessariamente a resolução da trama. Conforme dissemos acima, é possível haver uma crônica narrativa sem conflito. Dessa forma, não há necessidade de haver uma amarração final. O autor é livre para encerrar o texto da maneira que achar mais interessante.

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Como se faz uma ótima crônica narrativa?

O passo a passo abaixo te ajudará na construção de uma crônica narrativa de qualidade e que chame a atenção do leitor.

1) Estude o gênero crônica narrativa

O primeiro passo é estudar o gênero crônica narrativa. Procure os principais cronistas brasileiros, tais como Fernando Sabino, Érico Veríssimo, Paulo Mendes de Campos, Nelson Rodrigues e Lima Barreto. É a partir da leitura desses excelentes cronistas que você conseguirá visualizar como o enredo, as personagens, as relações de tempo e espaço dentro da obra são construídos, bem como as escolhas de narração (foco narrativo).

2) Observe os hábitos cotidianos

A crônica narrativa é dedicada a acontecimentos cotidianos. Procure observar, ler e estudar sobre os comportamentos, as motivações e as atividades feitas pelas pessoas na correria do dia a dia. A ideia da crônica é justamente produzir um conteúdo que produza aproximação com o leitor por ele já ter vivido tais situações. Para ajudar nessa etapa, é importante anotar, sempre que possível, uma descoberta ou acontecimento novo.

3) Encontre a história ideal

Após uma série de anotações e observações do cotidiano, possivelmente que você obterá um material robusto com o qual poderá trabalhar. A história ideal, passível de ser transformada em crônica, pode ser um acontecimento inesperado enquanto se esperava o ônibus, uma festa de aniversário chata à qual alguém resolveu faltar, um constrangimento vivido ou qualquer outra situação cotidiana que você acredita que pode render uma boa narrativa e com a qual os leitores vão se identificar.

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4) Monte a estrutura do seu texto

Após definir o que será dito na crônica narrativa, é preciso organizá-la estruturalmente. Tenha estabelecidas as personagens, o ambiente e o tempo em que a trama ocorrerá. É importante também saber como você fará a sua narrativa. Ela vai se dar por meio de diálogos diretos, com maior dinamicidade, ou você prefere a presença de um narrador? O foco narrativo é fundamental para a construção de textos de natureza narrativa.

5) Crie um efeito de surpresa

A crônica narrativa geralmente apresenta um efeito de surpresa para pegar os leitores desprevenidos e deixá-los ainda mais instigados com o texto. Assim, durante o processo de escrita, é importante oferecer elementos que vão culminar no efeito de surpresa no final.

Exemplo de crônica narrativa

A primeira provocação ele aguentou calado. Na verdade, gritou e esperneou. Mas todos os bebês fazem assim, mesmo os que nascem em maternidade, ajudados por especialistas. E não como ele, numa toca, aparado só pelo chão.

A segunda provocação foi a alimentação que lhe deram, depois do leite da mãe. Uma porcaria. Não reclamou porque não era disso.

Outra provocação foi perder a metade dos seus dez irmãos, por doença e falta de atendimento. Não gostou nada daquilo. Mas ficou firme. Era de boa paz.

Foram lhe provocando por toda a vida.

Não pôde ir a escola porque tinha que ajudar na roça. Tudo bem, gostava da roça. Mas aí lhe tiraram a roça.

Na cidade, para aonde teve que ir com a família, era provocação de tudo que era lado. Resistiu a todas. Morar em barraco. Depois perder o barraco, que estava onde não podia estar. Ir para um barraco pior. Ficou firme.

Queria um emprego, só conseguiu um subemprego. Queria casar, conseguiu uma submulher. Tiveram subfilhos. Subnutridos. Para conseguir ajuda, só entrando em fila. E a ajuda não ajudava.

Estavam lhe provocando.

Gostava da roça. O negócio dele era a roça. Queria voltar pra roça.

Ouvira falar de uma tal reforma agrária. Não sabia bem o que era. Parece que a ideia era lhe dar uma terrinha. Se não era outra provocação, era uma boa.

Terra era o que não faltava.

Passou anos ouvindo falar em reforma agrária. Em voltar à terra. Em ter a terra que nunca tivera. Amanhã. No próximo ano. No próximo governo. Concluiu que era provocação. Mais uma.

Finalmente ouviu dizer que desta vez a reforma agrária vinha mesmo. Para valer. Garantida. Se animou. Se mobilizou. Pegou a enxada e foi brigar pelo que pudesse conseguir. Estava disposto a aceitar qualquer coisa. Só não estava mais disposto a aceitar provocação.

Aí ouviu que a reforma agrária não era bem assim. Talvez amanhã. Talvez no próximo ano… Então protestou.

Na décima milésima provocação, reagiu. E ouviu espantado as pessoas dizerem, horrorizadas com ele:

— Violência, não!

O texto acima é uma crônica de Luis Fernando Verissimo intitulada “Provocações”. O texto utilizou um narrador para contar as diversas etapas da vida da personagem, que conviveu com uma série de provocações.

A crônica narrativa de Verissimo pode facilmente atingir o leitor por abordar conteúdos cotidianos (as chamadas provocações) que podem acabar sensibilizando o público. Assim, o texto trata, por meio de linguagem simples e direita, de questões estruturais da sociedade e da violência cometida cotidianamente pelas instituições ou por pessoas que detêm o poder sobre os mais vulneráveis.

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Diferença entre crônica e crônica narrativa

Segundo o Dicionário de Gêneros Textuais, a palavra crônica é usada para designar um campo amplo que inclui uma série de textos provenientes do âmbito jornalístico contendo linguagem simples, interlocução direta com o leitor e presença de marcas típicas da oralidade. Dessa forma, a crônica possui uma série de tipos, com características próprias. Ela pode ser uma crônica argumentativa, em que prevalece a defesa de um ponto de vista; uma crônica filosófica, com reflexões sobre a existência humana ou outros elementos; ou uma crônica narrativa, dedicada à narração de histórias cotidianas pessoais, engraçadas e/ou sentimentais.

A crônica narrativa é, portanto, um dos tipos que caracterizam o gênero crônica, também conhecida por crônica literária. Sua principal diferença quanto às demais se dá justamente na prevalência da narração, e não da argumentação e da exposição.

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