Foco narrativo
O foco narrativo refere-se ao ponto de vista adotado pelo narrador em uma história. Ele pode estar em primeira ou em terceira pessoa.
Por Mariana Carvalho Machado Cortes

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O foco narrativo é o ponto de vista adotado na história, o qual aparece por meio de elementos concretos do texto, como os pronomes pessoais e os verbos. O foco narrativo pode ser em primeira ou em terceira pessoa. Essa escolha será importante para a elaboração do narrador. Este é a construção ficcional da voz que fala no texto. Os tipos de narradores são: personagem, observador e onisciente. O narrador-personagem utiliza o foco narrativo em primeira pessoa. O observador utiliza o foco narrativo em terceira pessoa.
Leia também: Gênero narrativo — os elementos dos textos que contam histórias
Resumo sobre o foco narrativo
- O foco narrativo é o ponto de vista adotado na narrativa.
- O foco narrativo pode ser em primeira ou em terceira pessoa.
- O foco narrativo em primeira pessoa é mais subjetivo e parcial.
- O foco narrativo em terceira pessoa é mais objetivo é imparcial.
- O foco narrativo em primeira pessoa é identificado por meio de elementos textuais como: eu, me, mim, comigo, meu, minha e verbos conjugados na primeira pessoa do singular.
- O foco narrativo em terceira pessoa é identificado por meio de elementos textuais como: ele, ela, o, a, lhe, se, si, consigo, seu, sua e verbos conjugados na terceira pessoa do singular ou do plural.
- Os narradores podem ser: personagem, observador e onisciente.
- O narrador-personagem participa da história, é mais subjetivo e utiliza o foco narrativo em primeira pessoa.
- O narrador-observador atém-se aos fatos da história e às ações dos personagens. Utiliza o foco narrativo em terceira pessoa.
- O narrador-onisciente sabe não só das ações, mas também dos sentimentos e dos pensamentos das personagens. Utiliza o foco narrativo em terceira pessoa.
O que é foco narrativo?
O foco narrativo refere-se ao ponto de vista que um texto assume ao contar a sua história. Por meio dessa escolha, os mecanismos textuais são utilizados de maneira que haja coerência com a perspectiva utilizada para a narração. O foco narrativo é importante, uma vez que define o modo de imersão e de contato que o leitor tem com a história. Por meio do foco narrativo, portanto, estabelece-se um ponto de vista único para a história, de maneira que, se houver interferências de outras vozes no texto, essas sejam intermediadas pelo foco narrativo principal. Isso não quer dizer que esse não possa mudar no decorrer do texto, mas sim que o seu estabelecimento inicial contribui para um entendimento mais claro do texto.
Quais são os focos narrativos?
Os focos narrativos são divididos em primeira e terceira pessoas. O foco narrativo em primeira pessoa confere uma perspectiva mais particular, pessoal e próxima aos fatos da história; por isso, está relacionado ao narrador personagem. O foco narrativo em terceira confere uma perspectiva mais abrangente, imparcial e distante; por isso, está relacionado ao narrador-observador ou ao narrador-onisciente.
Como identificar o foco narrativo do texto?
Identifica-se o foco narrativo de um texto por meio de termos cuja classe gramatical evidencie a pessoa do discurso. Portanto, o uso de pronomes pessoais do caso reto, do caso oblíquo, de pronomes possessivos, demonstrativos, de verbos conjugados na primeira pessoa do singular e até de advérbios podem denunciar a posição da pessoa do discurso. Assim, em textos cujo foco narrativo é a primeira pessoa, encontram-se termos como: eu, me, mim, comigo, meu, minha, este e aqui. Em textos cujo foco narrativo é a terceira pessoa, encontram-se termos como: ele, ela, o, a, lhe, se, si, consigo, seu, sua, aquele e ali.
Quais os tipos de narrador?
Os tipos de narradores são: personagem, observador e onisciente.
- Narrador-observador: tem como foco narrativo a terceira pessoa. Por isso, atém-se aos fatos da história de maneira mais objetiva e imparcial. Ele não sabe o que passa na cabeça dos personagens, apenas relata as suas ações. Assim, não aparece na história e não interfere nela.
- Narrador-onisciente: tem como foco narrativo também a terceira pessoa. Ele também é mais distante e imparcial, mas pode mostrar a perspectiva de outros personagens do texto, uma vez que é um narrador que sabe de seus pensamentos, sentimentos e impressões. O narrador onisciente sabe de tudo o que acontece na trama e de tudo o que acontecerá, o que passa a sensação de que ele tem total controle sobre as ações da história. Também não aparece ou interfere na história.
- Narrador-personagem: tem como foco narrativo a primeira pessoa. É um narrador com uma perspectiva parcial e subjetiva, uma vez que conta os acontecimentos da história por meio de seu ponto de vista de dentro da narrativa, participando da história e da condução de seu enredo. Esse tipo de narração passa a impressão de que os personagens têm domínio sobre as ações da história.
Foco narrativo x narrador
O narrador é o elemento da narrativa que é responsável por ser a voz contadora da história. É importante lembrar que narrador é diferente de autor. Este é a pessoa física que constrói o texto; aquele é uma criação ficcional que fala dentro do texto. Mesmo que o narrador não seja personagem, ele ainda pode expressar opiniões ou ser retratado de uma forma muito diferente do autor.
O foco narrativo é uma técnica utilizada para adoção de um ponto de vista do enredo por meio de um ângulo específico. O foco narrativo é evidenciado dentro do texto por meio de elementos concretos, como pronomes e verbos, os quais podem aparecer em primeira ou em terceira pessoa.
O foco narrativo contribui para a construção do narrador, uma vez que a adoção do ponto de vista da narrativa é o primeiro passo para a construção deste. Se for adotado um foco narrativo em primeira pessoa, automaticamente, é gerado um narrador-personagem, o qual deve participar ativamente da história e contá-la por meio da sua perspectiva. Se for adotado um foco narrativo em terceira pessoa, gera-se um narrador-observador ou um onisciente. Ambos não podem participar ativamente da história. Assim, o foco narrativo torna-se uma das características que compõem a construção ficcional do narrador.
Leia também: Gênero épico — as narrativas em que há um herói
Exercícios sobre foco narrativo
1. (MS Concursos) Sobre foco narrativo e tipos de narrador, analise os itens e assinale a alternativa correta.
I- Os tipos de narrador são o narrador personagem (em primeira pessoa), que participa da história; o narrador observador (em terceira pessoa), que apenas narra o que vê; e o narrador onisciente (também em terceira pessoa), que tem total conhecimento de personagens e fatos.
II- Cada narrador tem um ponto de vista, isto é, um foco narrativo, uma perspectiva particular da história.
III- Uma história pode ser narrada de diferentes perspectivas, isto é, de distintos pontos de vista. O narrador pode fazer parte da trama e, assim, expor sua visão particular dos fatos, mas pode também estar de fora, apenas como um observador dos acontecimentos, ou mesmo detentor de um conhecimento prévio acerca do enredo. Essas diferentes maneiras de narrar-se uma história chamamos de foco narrativo.
IV- A escolha do foco narrativo determina os rumos da narrativa. Assim, decidir que tipo de narrador fará o relato dos fatos é uma das primeiras preocupações do criador da obra, ou seja, o autor. Aliás, é importante ressaltar que autor e narrador são seres distintos. O autor ou autora é um ser real, um indivíduo de carne e osso, que cria, planeja e escreve a história. Já o narrador é a voz que narra os acontecimentos, um ser fictício, mesmo que não faça parte, como personagem, da trama.
(Fonte: https://www.portugues.com.br – adaptado).
a) Todos os itens estão corretos.
b) Apenas os itens II, III e IV estão corretos.
c) Apenas os itens III e IV estão corretos.
d) Apenas os itens I, II e III estão corretos.
e) Apenas os itens II e IV estão corretos.
GABARITO: A.
Todas as alternativas estão corretas. Na primeira afirmativa, a descrição dos narradores está correta. A segunda afirmativa define corretamente o que seria o foco narrativo, que seria um ponto de vista adotado sobre a história. Na terceira afirmativa, é traçada a relação entre foco narrativo e narrador. Na quarta afirmativa, há a correta distinção entre autor e narrador.
2. (Funcern) UMA VELA PARA DARIO
(Dalton Trevisan)
Dario vem apressado, guarda-chuva no braço esquerdo. Assim que dobra a esquina, diminui o passo até parar, encosta-se a uma parede. Por ela escorrega, senta-se na calçada, ainda úmida de chuva. Descansa na pedra o cachimbo.
Dois ou três passantes à sua volta indagam se não está bem. Dario abre a boca, move os lábios, não se ouve resposta. O senhor gordo, de branco, diz que deve sofrer de ataque.
Ele reclina-se mais um pouco, estendido na calçada, e o cachimbo apagou. O rapaz de bigode pede aos outros se afastem e o deixem respirar. Abre-lhe o paletó, o colarinho, a gravata e a cinta. Quando lhe tiram os sapatos, Dario rouqueja feio, bolhas de espuma surgem no canto da boca.
Cada pessoa que chega ergue-se na ponta dos pés, não o pode ver. Os moradores da rua conversam de uma porta a outra, as crianças de pijama acodem à janela. O senhor gordo repete que Dario sentou-se na calçada, soprando a fumaça do cachimbo, encostava o guarda-chuva na parede. Mas não se vê guarda-chuva ou cachimbo a seu lado.
A velhinha de cabeça grisalha grita que ele está morrendo. Um grupo o arrasta para o táxi da esquina. Já no carro a metade do corpo, protesta o motorista: quem pagará a corrida? Concordam chamar a ambulância. Dario conduzido de volta e recostado à parede — não tem os sapatos nem o alfinete de pérola na gravata.
Alguém informa da farmácia na outra rua. Não carregam Dario além da esquina; a farmácia no fim do quarteirão e, além do mais, muito peso. É largado na porta de uma peixaria. Enxame de moscas lhe cobrem o rosto, sem que façam um gesto para espantá-las.
Ocupado o café próximo pelas pessoas que apreciam o incidente e, agora, comendo e bebendo, gozam as delícias da noite. Dario em sossego e torto no degrau da peixaria, sem o relógio de pulso.
Um terceiro sugere lhe examinem os papéis, retirados — com vários objetos —de seus bolsos e alinhados sobre a camisa branca. Ficam sabendo do nome, idade, sinal de nascença. O endereço na carteira é de outra cidade.
Registra-se correria de uns duzentos curiosos que, a essa hora, ocupam toda a rua e as calçadas: é a polícia. O carro negro investe a multidão. Várias pessoas tropeçam no corpo de Dario, pisoteado dezessete vezes.
O guarda aproxima-se do cadáver, não pode identificá-lo — os bolsos vazios. Resta na mão esquerda a aliança de ouro, que ele próprio — quando vivo — só destacava molhando no sabonete. A polícia decide chamar o rabecão.
A última boca repete — Ele morreu, ele morreu. E a gente começa a se dispersar. Dario levou duas horas para morrer, ninguém acreditava que estivesse no fim. Agora, aos que alcançam vê-lo, todo o ar de um defunto.
Um senhor piedoso dobra o paletó de Dario para lhe apoiar a cabeça. Cruza as mãos no peito. Não consegue fechar olho nem boca, onde a espuma sumiu. Apenas um homem morto e a multidão se espalha, as mesas do café ficam vazias. Na janela alguns moradores com almofadas para descansar os cotovelos.
Um menino de cor e descalço vem com uma vela, que acende ao lado do cadáver. Parece morto há muitos anos, quase o retrato de um morto desbotado pela chuva.
Fecham-se uma a uma as janelas. Três horas depois, lá está Dario à espera do rabecão. A cabeça agora na pedra, sem o paletó. E o dedo sem a aliança. O toco de vela apaga-se às primeiras gotas da chuva, que volta a cair.
Texto extraído do livro "Vinte Contos Menores", Editora Record – Rio de Janeiro, 1979, pág. 20. Este texto faz parte dos 100 melhores contos brasileiros do século, seleção de Ítalo Moriconi para a Editora Objetiva.
O foco narrativo utilizado pelo narrador no conto está especificado na alternativa:
a) 3ª pessoa – narrador-personagem.
b) 2ª pessoa – narrador onipresente.
c) 3ª pessoa – narrador observador.
d) 1ª pessoa – narrador onisciente.
GABARITO: C.
A alternativa A está errada, pois o foco narrativo do narrador-personagem sempre é a 1ª pessoa. A alternativa B está errada, pois não se usa foco narrativo em 2ª pessoa. A alternativa C está correta, pois o narrador apenas conta as ações dos personagens, e o texto é relatado em 3ª pessoa, como ocorre com o narrador-observador. A alternativa D está errada, pois não há narrador onisciente nem foco narrativo em primeira pessoa no texto. Além disso, o narrador-onisciente é utilizado com o foco narrativo em terceira pessoa.
Fontes
LEITE, Ligia Chiappini Moraes. O Foco Narrativo. São Paulo: Ática, 2002.
CARVALHO, Alfredo Leme Coelho de. Foco narrativo e fluxo de consciência: questões de teoria literária. São Paulo: Pioneira, 1981.