Gregório de Matos Guerra

Por Warley Souza

Gregório de Matos Guerra, poeta do barroco brasileiro, nasceu no dia 20 de dezembro de 1636, em Salvador, no estado da Bahia. O poeta, filho de portugueses, estudou na Universidade de Coimbra, em Portugal, onde se formou em Direito, ocupou os cargos de juiz de fora e de procurador, e ficou conhecido por suas sátiras. Contudo, foi no Brasil que sua poesia assumiu caráter relevante e acabou criando inimizades para o poeta.

Autor de poesias lírico-filosóficas, sacras, satíricas, eróticas e pornográficas, o escritor atacava o governo, os fidalgos e o clero. Por isso, recebeu o apelido de Boca do Inferno e acabou sendo condenado ao degredo em Angola. No entanto, morreu no Brasil, em 26 de novembro de 1695 ou 1696, deixando uma obra caracterizada por traços barrocos, como o fusionismo, o culto ao contraste, o cultismo, o conceptismo e o uso de antíteses e paradoxos.

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Biografia de Gregório de Matos Guerra

Gregório de Matos Guerra, por F. Briguiet (século XIX).
Gregório de Matos Guerra, por F. Briguiet (século XIX).

Gregório de Matos Guerra nasceu em Salvador, Bahia, em 20 de dezembro de 1636. Era filho de uma família de portugueses abastada. No Brasil, o poeta estudou em colégio de jesuítas. Mais tarde, foi estudar em Portugal, na Universidade de Coimbra, onde se formou em Direito, ocupou o cargo de juiz de fora e depois de procurador. Já com mais de 40 anos de idade, voltou ao Brasil para assumir o cargo de tesoureiro-mor da Sé, do qual foi destituído por insubordinação.

O poeta apaixonou-se pela viúva Maria dos Povos, e seu relacionamento com ela acabou levando-o à miséria, então se entregou a uma vida boêmia. Já escrevia sátiras em Portugal, e, ao voltar ao Brasil, não poupou a sociedade baiana e seus costumes. Além da poesia satírica, escrevia também poesia erótica (às vezes, pornográfica), o que provocou o incômodo e o divertimento da sociedade da época. No entanto, suas sátiras também lhe rederam algumas inimizades.

Em 1685, foi denunciado ao Tribunal do Santo Ofício (a Inquisição), acusado de ofender a Jesus Cristo e de não mostrar o devido respeito em procissões. Contudo, o processo foi anulado, provavelmente por causa da influência de sua família. Em 1694, o Boca do Inferno, alcunha recebida devido aos seus poemas satíricos, foi deportado para Angola. O governador e amigo d. João de Lencastre (1646-1707) pretendia, assim, impedir que o poeta fosse assassinado.

Em Angola, advogou em Luanda e ajudou o governo a combater uma conspiração local. Assim, recebeu autorização para voltar ao Brasil. No entanto, não podia entrar na
Bahia. Foi viver, então, em Recife, Pernambuco, onde morreu em 26 de novembro de 1695 ou 1696. Não publicou nada em vida, sua poesia era manuscrita e assim distribuída entre os seus leitores da época. A primeira edição de poemas atribuídos ao autor só foi realizada no século XX.

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Características literárias de Gregório de Matos Guerra

Gregório de Matos Guerra é um poeta do barroco brasileiro, portanto, suas obras podem apresentar as seguintes características:

  • Fusionismo: harmonia entre os opostos
  • Culto ao contraste:
    • Antropocentrismo versus teocentrismo
    • Sagrado versus profano
    • Luz versus sombra
    • Paganismo versus cristianismo
    • Racional versus irracional
    • Oposição e contradição: uso de antíteses e paradoxos
    • Pessimismo
    • Feísmo
    • Rebuscamento da linguagem
    • Imagens hiperbólicas
  • Cultismo ou gongorismo: jogo de palavras
  • Conceptismo ou quevedismo: jogo de ideias
  • Morbidez
  • Sentimento de culpa
  • Consciência da fugacidade do tempo
  • Concepção trágica da vida
  • Carpe diem: aproveite o momento
  • Uso de hipérbatos e sinestesia
  • Emprego da medida nova: decassílabos

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Obras de Gregório de Matos Guerra

O escritor Gregório de Matos Guerra não publicou nenhuma obra em vida. Em sua época, seus poemas eram manuscritos e corriam de mão em mão, o que foi suficiente para fazer a fama do poeta. Só no século XX, entre 1923 e 1933, que a primeira edição de sua poesia foi publicada, em seis volumes, pela Academia Brasileira de Letras.

O poeta produziu poesia lírico-filosófica, sacra e satírica. Além desses três tipos, há a poesia erótica ou pornográfica. Suas sátiras atacavam o governo, a nobreza e o clero. Já a poesia lírico-filosófica e os poemas sacros discutiam temas como: a fragilidade da vida, a fugacidade do tempo, a vaidade, as contradições do amor, o pecado, a culpa e o poder divino.

Assim, no soneto Desaires da formosura, o eu lírico faz uma crítica à vaidade. Na primeira estrofe, realiza uma descrição exagerada do rosto de Caterina, pois compara seus lábios a um rubi; seus dentes, a pérolas; sua pele, a cristal e prata; seus olhos, a safiras; seu cabelo, a ouro. Na sequência, caracteriza tal mulher como “divina” e “ingrata”, e fala da paixão de Fábio, que, rejeitado, apresenta uma imperfeição de Caterina, de forma a tornar a vaidade dela injustificada:

Desaires da formosura

Rubi, concha de perlas peregrina,
Animado cristal, viva escarlata,
Duas safiras sobre lisa prata,
Ouro encrespado sobre prata fina.

Este o rostinho é de Caterina;
E porque docemente obriga e mata,
Não livra o ser divina em ser ingrata,
E raio a raio os corações fulmina.

Viu Fábio uma tarde transportado
Bebendo admirações, e galhardias,
A quem já tanto amor levantou aras:

Disse igualmente amante e magoado:
Ah muchacha gentil, que tal serias
Se sendo tão formosa não cagaras!

Já em Aos caramurus da Bahia, o eu lírico tece uma crítica aos falsos nobres da cidade de Salvador. Segundo ele, os fidalgos (filhos de algo, pessoas importantes) não passavam de descendentes de Caramuru, ou seja, Diogo Álvares Correia (1475-1557), náufrago português que viveu entre os tupinambás e recebeu como esposa Paraguaçu, a filha do chefe da tribo. É preciso entender que, no contexto da época, os índios eram vistos como seres inferiores. Portanto, sugerir que o sangue indígena corria nas veias dos fidalgos da Bahia configurava-se em uma ofensa:

Aos caramurus da Bahia

Um calção de pindoba à meia zorra,
Camisa de urucu, mantéu de arara,
Em lugar de cotó, arco e taquara,
Penacho de guarás, em vez de gorra.

Furado o beiço, sem temer que morra
O pai, que lho envasou cuma titara,
Sendo a Mãe que a pedra lhe aplicara
Por reprimir-lhe o sangue, que não corra.

Alarve sem razão, bruto sem fé,
Sem mais leis que a do gosto, quando erra,
De Paiaiá tornou-se em Abaité.

Não sei como acabou, nem em que guerra:
Só sei que deste Adão de Massapé,
Procedem os fidalgos desta terra.

Por fim, no soneto Buscando a Cristo, o eu lírico utiliza antíteses para demonstrar que, mesmo ele sendo um pecador, ao arrepender-se, sua alma será salva e receberá o perdão divino:

Buscando a Cristo

A vós correndo vou, braços sagrados,
Nessa cruz sacrossanta descobertos,
Que, para receber-me, estais abertos,
E, por não castigar-me, estais cravados.

A vós, divinos olhos, eclipsados
De tanto sangue e lágrimas abertos,
Pois, para perdoar-me, estais despertos,
E, por não condenar-me, estais fechados.

A vós, pregados pés, por não deixar-me,
A vós, sangue vertido, para ungir-me,
A vós, cabeça baixa, pra chamar-me.

A vós, lado patente, quero unir-me,
A vós, cravos preciosos, quero atar-me,
Para ficar unido, atado e firme.

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