Ferreira Gullar

Por Warley Souza

Ferreira Gullar, poeta brasileiro, nasceu em 10 de setembro de 1930, em São Luís do Maranhão. Publicou seu primeiro livro — Um pouco acima do chão — em 1949. Participou do Movimento Concretista, na década de 1950, e foi um dos idealizadores do Neoconcretismo. Porém, sua poesia é marcada pelo engajamento político. Filiado ao Partido Comunista Brasileiro (PCB) em 1964, foi perseguido pela ditadura militar brasileira, o que levou o poeta a exilar-se na França, União Soviética, Chile, Peru e Argentina.

Sua volta ao Brasil ocorreu após a publicação, em 1976, de seu livro mais conhecido — Poema sujo. O escritor, um dos principais nomes da Geração de 1945 e membro da Academia Brasileira de Letras, recebeu prêmios importantes, como o Jabuti e o Camões. Morreu em 4 de dezembro de 2016, depois de dedicar sua vida a fazer uma poesia (a princípio, experimental) marcada pelo cuidado formal e pela temática sociopolítica, uma poesia que, como disse o autor, “quer ser o inexplicável, a expressão do que espanta e fascina, sem ter explicação”.

Leia também: João Cabral de Melo Neto – o poeta-engenheiro

Biografia de Ferreira Gullar

Ferreira Gullar, em 1970.

Ferreira Gullar (José Ribamar Ferreira) nasceu em 10 de setembro de 1930, em São Luís do Maranhão. Durante a adolescência, era leitor de poesia parnasiana, influência marcante em sua primeira obra. Com 18 anos de idade, trabalhava como redator no Diário de São Luís, enquanto finalizava a escrita de seu primeiro livroUm pouco acima do chão —, publicado em 1949. Nesse ano, passou a ter contato com a poesia moderna de autores como Carlos Drummond de Andrade (1902-1987).

Em 1951, o poeta mudou-se para o Rio de Janeiro. Ali, trabalhou para as revistas O Cruzeiro e Manchete, além do Diário Carioca e do Jornal do Brasil. A partir de 1954, ingressou no Movimento Concretista e, em 1956, participou da Exposição Nacional de Arte Concreta, no Museu de Arte Moderna em São Paulo. Mas, em 1959, encabeçou o Movimento Neoconcreto, em rompimento com os concretistas.

Em 1961, dirigiu a Fundação Cultural de Brasília e criou o Museu de Arte Popular. Em 1962, começou a trabalhar em O Estado de São Paulo. Em 1963, tornou-se presidente do Centro Popular de Cultura da União Nacional dos Estudantes (CPC/ UNE). Em 1964, Ferreira Gullar filiou-se ao Partido Comunista Brasileiro (PCB) e passou a fazer uma poesia mais política e combativa, em resposta à ditadura militar. Nesse ano, fundou, com outros artistas, o Grupo Opinião, que fazia um teatro de protesto e resistência ao regime ditatorial.

Em 1968, devido ao Ato Institucional número 5 (AI-5), foi preso. Em 1970 viveu na clandestinidade. Em 1971, iniciou seu exílio na França, União Soviética, Chile, Peru e Argentina. Voltou ao Brasil, em 1977, depois da publicação de seu grande sucesso, o Poema sujo, em 1976. Passou a trabalhar como roteirista para a televisão, além de escrever para jornais. E, de 1992 a 1995, foi diretor da Funarte.

Em 2014, foi eleito para a Academia Brasileira de Letras. E faleceu em 4 de dezembro de 2016, no Rio de Janeiro. Porém, durante sua vida, teve amplo reconhecimento. Assim, o poeta, dramaturgo, tradutor e crítico de artes plásticas Ferreira Gullar recebeu os seguintes prêmios:

  • Prêmio Molière (1966)
  • Prêmio Saci (1966)
  • Prêmio Jabuti (2007, 2011)
  • Prêmio Camões (2010)

Estilo literário de Ferreira Gullar

Ferreira Gullar é, principalmente, um autor integrante da Geração de 1945, cujas obras apresentam as seguintes características:

  • Cuidado formal
  • Temática social
  • Lirismo contido
  • Realismo
  • Engajamento político

Além disso, o poeta participou do Concretismo:

  • Experimentação formal
  • Oposição à poesia intimista
  • Associação entre palavra, som e imagem
  • Ausência de versos
  • Exploração do espaço da página
  • Presença de metalinguagem
  • Objetividade

E também fez parte do Neoconcretismo:

  • Arte interativa
  • Poema não objeto
  • Antipositivismo
  • Expressionismo

Leia também: Clarice Lispector – representante da literatura intimista da geração de 1945

Principais obras de Ferreira Gullar

Capa do livro Poema sujo, de Ferreira Gullar, publicado pela editora Companhia das Letras.[1]
  • Um pouco acima do chão (1949)
  • A luta corporal (1954)
  • Poemas (1958)
  • João Boa-Morte: cabra marcado pra morrer (1962)
  • Quem matou Aparecida (1962)
  • A luta corporal e novos poemas (1966)
  • Por você, por mim (1968)
  • Dentro da noite veloz (1975)
  • Poema sujo (1976)
  • Um rubi no umbigo (1978)
  • Uma luz no chão (1978)
  • Na vertigem do dia (1980)
  • Crime na flora ou Ordem e progresso (1986)
  • Barulhos (1987)
  • A estranha vida banal (1989)
  • Indagações de hoje (1989)
  • Formigueiro (1991)
  • Gamação (1996)
  • Cidades inventadas (1997)
  • Rabo de foguete (1998)
  • Muitas vozes (1999)
  • O touro encantado (2003)
  • Relâmpagos (2003)

Veja também: Poesia Marginal.

Poemas de Ferreira Gullar

No poema “O lampejo”, do livro Barulhos, a voz poética compara o poema ao povo. Assim, ela expõe as desigualdades sociais do Brasil, além da violência e exploração sofridas por esse povo. No entanto, o eu lírico termina o poema com um tom de esperança, pois o “lampejo” no olhar do povo pode ser lido como a consciência, algo que pode levar à revolução:

O lampejo


O poema não voa de asa-delta
não mora na Barra
não frequenta o Maksoud.
Pra falar a verdade, o poema não voa:
anda a pé
e acaba de ser expulso da fazenda Itupu
                                          pela polícia.

Come mal dorme mal cheira a suor,
parece demais com o povo:

é assaltante?
é posseiro?
é vagabundo?

frequentemente o detêm para averiguações

às vezes o espancam
às vezes o matam
às vezes o resgatam
da merda

          por um dia

e o fazem sorrir diante das câmeras da Tv
de banho tomado.


[...]

e no fundo do olhar, no mais fundo,

               detrás de todo o amargor,

guarda um lampejo —
um diamante
duro como um homem

e é isso que obriga o exército a se manter de prontidão.

Quanto às suas características de estilo, é possível perceber um cuidado formal na distribuição dos versos na página, além da temática social e do engajamento político, que, aliás, tem seu ápice no último verso do poema. É também um texto contido, sem derramamentos sentimentais; chega a ser seco, quase direto, e bem realista.

Já o livro Poema sujo é um longo poema autobiográfico, em que o autor, de forma lírica, pretende expressar, em versos, os anos vividos em São Luís do Maranhão:

Poema sujo

bela bela
mais que bela
mas como era o nome dela?
Não era Helena nem Vera
nem Nara nem Gabriela
nem Tereza nem Maria
Seu nome seu nome era...
Perdeu-se na carne fria
perdeu-se na confusão de tanta noite e tanto dia
perdeu-se na profusão das coisas acontecidas
constelações de alfabeto
noites escritas a giz
pastilhas de aniversário
domingos de futebol
enterros corsos comícios
roleta bilhar baralho
mudou de cara e cabelos mudou de olhos e risos mudou de casa
e de tempo: mas está comigo está
perdido comigo
teu nome
em alguma gaveta
[...]

Nesse trecho de Poema sujo, é possível perceber, como em “O lampejo”, o mesmo cuidado formal ou estrutural que marca a poesia de 1945, bem como a palavra enxuta, a expressão direta.

Veja também: Cora Coralina – poeta goiana que não se filiou a nenhum movimento literário

Frases de Ferreira Gullar

A seguir, vamos ler algumas frases de Ferreira Gullar, extraídas de entrevista concedida à Folha de S. Paulo:

“A poesia é fundamental para as pessoas porque elas vivem uma vida alucinada em que todo valor é banalizado.”

“Em época alguma do mundo a maioria procurou a poesia.”

“Existe poesia em tudo.”

“Fora do poema, a poesia é uma promessa, uma expectativa.”

“A poesia não salva ninguém porque isso aí é função de bombeiro.”

“Tudo é o mundo real.”

“A arte é uma afirmação da humanidade das pessoas.”

“A poesia quer ser o inexplicável, a expressão do que espanta e fascina, sem ter explicação.”

“Nós estamos condenados ao futuro.”

“O amor não te julga.”

“A morte é só o fim.”

 

Crédito da imagem

[1] Companhia das Letras (reprodução)

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