A ironia (ou antífrase) é uma figura de linguagem utilizada para dizer-se algo por meio de expressões que remetem propositalmente ao oposto do que se quis dizer. Seu uso é bastante comum, e esse jogo de sentidos que se ligam pela inversão gera, muitas vezes, um tom de comicidade ou de deboche, podendo ser um mero gracejo até um discurso mais sarcástico. Por sua versatilidade, é um recurso estilístico muito comum e usado em diversas possibilidades, como veremos a seguir.
A palavra ironia vem do grego, eironéia, que significa “dissimulação”. A palavra antífrase também vem do grego, antiphrasis, que significa “expressão contrária”. Assim, é possível perceber-se o efeito do uso da ironia, certo?
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É comum distinguir a ironia com base em suas fontes, tendo dois tipos: a ironia verbal (também chamada de ironia instrumental), cuja fonte é o próprio falante que a expressa, e a ironia observável (também chamada de ironia situacional ou, ainda, de ironia de situação), cuja fonte não é a mente do indivíduo, e sim a circunstância irônica da realidade.
Diz respeito ao discurso irônico, isto é, ao ato de falar-se ou representar-se algo querendo, na verdade, remeter-se ao seu inverso. Costuma ocorrer de maneira proposital, mas não necessariamente será percebida pelo interlocutor.
Dentro dessa categoria, encontra-se a ironia oral (fala-se algo com a intenção de expressar-se o oposto) e também a ironia dramática, presente em obras artísticas, quando leitor, telespectador ou plateia captam facilmente a ironia do discurso, enquanto as personagens que o vivenciam, não.
Esse termo, diferentemente da ironia verbal, remete à ironia presente no campo da ação e da realidade, ou seja, a situação configura-se irônica por si só (independentemente da fala de alguém ou de um discurso verbal).
A ironia é um recurso muito utilizado no dia a dia, mas também em obras artísticas. Vejamos alguns exemplos de seu uso.
“Puxa, que bom que o elevador quebrou! Agora só teremos que subir 12 lances de escada, são bem poucos.”
Certamente, a pessoa não está feliz por ter que subir 12 lances de escada.
“Que bonito, hein! Que cena mais linda! Será que eu estou atrapalhando o casalzinho aí?!”
As exclamações irônicas cantadas por Naiara Azevedo ao flagrar a traição do marido fizeram sucesso na abertura da música sertaneja 50 reais.
“Soares olhava para Camilo com a mesma ternura com que um gavião espreita uma pomba.”
Esse trecho do conto “O parasita azul”, de Machado de Assis, mostra por que o escritor é conhecido pelo uso frequente da ironia em suas obras, em uma época em que isso não era tão comum na literatura.
“Foi reforçada a guarda. Construíram uma terceira cerca. As famílias de mais posses, com mais coisas para serem roubadas, mudaram-se para uma chamada área de segurança máxima. E foi tomada uma medida extrema. Ninguém pode entrar no condomínio. Ninguém. Visitas, só num local predeterminado pela guarda, sob sua severa vigilância e por curtos períodos.”
Nesse trecho, o cronista Luís Fernando Veríssimo narra uma situação formulando uma sutil ironia de que os condôminos, que deveriam estar livres, estão presos para proteger-se de criminosos que estão livres. A situação por si só seria considerada uma ironia observável, no entanto, ao narrá-la, o cronista faz uma ironia verbal.
Com esses exemplos, podemos ver que a ironia pode ser utilizada nos mais diversos contextos, sendo popular em diversas épocas. Portanto, seria irônico dizer que essa figura de linguagem não é nada importante para o nosso idioma.
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Questão 1 - (Fuvest)
A certa personagem desvanecida
Um soneto começo em vosso gabo*:
Contemos esta regra por primeira,
Já lá vão duas, e esta é a terceira,
Já este quartetinho está no cabo.
Na quinta torce agora a porca o rabo;
A sexta vá também desta maneira:
Na sétima entro já com grã** canseira,
E saio dos quartetos muito brabo.
Agora nos tercetos que direi?
Direi que vós, Senhor, a mim me honrais
Gabando-vos a vós, e eu fico um rei.
Nesta vida um soneto já ditei;
Se desta agora escapo, nunca mais:
Louvado seja Deus, que o acabei.
Gregório de Matos
*louvor **grande
Tipo zero
Você é um tipo que não tem tipo
Com todo tipo você se parece
E sendo um tipo que assimila tanto tipo
Passou a ser um tipo que ninguém esquece
Quando você penetra num salão
E se mistura com a multidão
Você se torna um tipo destacado
Desconfiado todo mundo fica
Que o seu tipo não se classifica
Você passa a ser um tipo desclassificado
Eu até hoje nunca vi nenhum
Tipo vulgar tão fora do comum
Que fosse um tipo tão observado
Você ficou agora convencido
Que o seu tipo já está batido
Mas o seu tipo é o tipo do tipo esgotado
Noel Rosa
O soneto de Gregório de Matos e o samba de Noel Rosa, embora distantes na forma e no tempo, aproximam-se por ironizarem
a) o processo de composição do texto.
b) a própria inferioridade ante o retratado.
c) a singularidade de um caráter nulo.
d) o sublime que se oculta na vulgaridade.
e) a intolerância para com os gênios.
Resolução
Alternativa C. O soneto começa afirmando que fará louvores a alguém, entretanto, o eu lírico passa todo o poema sem tecer um elogio sequer, ironizando o fato de não haver elogios a serem feitos. Do mesmo modo, o samba fala sobre um “tipo que ninguém esquece” e que é “destacado” para, ao final, revelar que se trata de um “tipo desclassificado” e “esgotado”. Nos dois casos, há ironia ao destacar-se a falta de qualidades daqueles que ganharam um soneto e um samba em sua homenagem, ou seja, a singularidade de seu caráter nulo.
Questão 2 - (Unesp)
Os donos da comunicação
Os presidentes, os ditadores e os reis da Espanha que se cuidem porque os donos da comunicação duram muito mais. Os ditadores abrem e fecham a imprensa, os presidentes xingam a TV e os reis da Espanha cassam o rádio, mas, quando a gente soma tudo, os donos da comunicação ainda estão por cima. Mandam na economia, mandam nos intelectuais, mandam nas moças fofinhas que querem aparecer nos shows dos horários nobres e mandam no society que morre se o nome não aparecer nas colunas.
Todo mundo fala mal dos donos da comunicação, mas só de longe. E ninguém fala mal deles por escrito porque quem fala mal deles por escrito nunca mais vê seu nome e sua cara nos “veículos” deles. Isso é assim aqui, na Bessarábia e na Baixa Betuanalândia. Parece que é a lei.
O que também é muito justo porque os donos da comunicação são seres lá em cima. Basta ver o seguinte: nós, pra sabermos umas coisinhas, só sabemos delas pela mídia deles, não é mesmo? Agora vocês já imaginaram o que sabem os donos da comunicação que só deixam sair 10% do que sabem? Pois é; tem gente que faz greve, faz revolução, faz terrorismo, todas essas besteiras. Corajoso mesmo, eu acho, é falar mal de dono de comunicação. Aí tua revolução fica xinfrim, teu terrorismo sai em corpo 6 e se você morre vai lá pro fundo do jornal em quatro linhas.
(Millôr Fernandes. Que país é este?, 1978.)
Millôr Fernandes emprega com conotação irônica o termo inglês society, para referir-se a
a) pessoas dedicadas ao desenvolvimento da sociedade.
b) pessoas que fazem caridade apenas para aparecer nos jornais.
c) sociedades de atores de teatro, cinema e televisão.
d) norte-americanos ou ingleses muito importantes, residentes no país.
e) indivíduos presunçosos da chamada alta sociedade.
Resolução
Alternativa E. O termo society é uma referência ao termo em inglês high society, que significa alta sociedade. O uso do estrangeirismo remete à presunção dos indivíduos da alta sociedade, que “morre se o nome não aparecer nas colunas”.
O substantivo desempenha distintas funções sintáticas, tais como: sujeito, objeto direto, objeto indireto, etc
As palavras sessão, seção e cessão são homófonas heterográficas, entenda.
Foi um dos principais autores realistas do século XIX, e uma de suas obras mais famosas é o romance O idiota.
A literatura africana em língua portuguesa é dividida em três fases: colonização, pré-independência e pós-independência.
Consistem nas figuras de linguagem em que há o emprego de palavras com um sentido conotativo ou figurado